domingo, 13 de junho de 2010

quando consegue do peito tirar um espinho, é que a velha esperança já não pode morrer



era domingo. e pra ela. ah. pra ela todos os domingos eram iguais. domingo era dia de acordar a qualquer hora. e ela acordava a qualquer hora. olhava no celular as horas. e pensava. ainda não é qualquer hora. devia ser qualquer hora tarde. sim. qualquer hora ela levanta. e pensa. pensa que é domingo. abre a persiana. olha lá fora. aquela claridade de domingo. aquela claridade que raramente é clara. aquela claridade que só o domingo tem. levanta. troca de roupa. e é domingo. domingo é dia de usar aquela roupa. aquela roupa que ela nunca usaria durante a semana. aquela roupa que só pode ser usada durante a semana depois de ser usada num domingo. aquela roupa que sai pelas ruas procurando olhares. de aprovação. de reprovação. não interessa. olhares. o que ela quer. o que ela quer é que aquele domingo. um daqueles que são todos iguais. seja diferente. é nos olhares. é nos olhares que o domingo é diferente. mas os olhares. ah! os olhares são olhares de domingo. sim. e os domingos. os domingos eram sempre iguais. chega o almoço. o lugar varia. mas ah. isso não difere os domingos. o lugar varia. mas é sempre domingo. é sempre a mesma sensação de domingo. aquela sensação de se escolher. escolher sozinha pra que lado ir. se pra direita. se pra esquerda. escolher sozinha o que comer. se carne. se frango. e escolher sozinha o que se beber. coca. sempre coca. e enquanto espera. lê. lê. todo domingo é igual. todo domingo tem um almoço. sozinho. e um livro. o livro. o livro as vezes muda. mas demora. e o livro dos domingos. ah. o livro dos domingos. tem sido o do cartola. no primeiro domingo do cartola. ah. aquele domingo. aquele domingo parecia que não ia ser igual. porque naquele domingo. ela não ia almoçar sozinha. ela ia almoçar com o cartola. mas no fim do almoço. ah. o domingo foi igual. mas neste domingo. não foi diferente. era ela. era frango. era coca. e era cartola. era um domingo agradável. sim. era igual. mas igual. igual é agradável. não confunda. mas esse domingo. esse domingo aconteceu uma coisa diferente. todo domingo era igual. entre as linhas dos livros. era uma conversa paralela. e seus olhos acompanhavam as linhas do livro. mas seus ouvidos acompanhavam a conversa alheia. sim. era inevitável. por muitas vezes. ah. por muitas vezes a vontade era fechar o livro. pedir licença. pro cartola. e participar da conversa alheia. ah. muitas vezes. muitas vezes aquela conversa lhe chamava. e ela quase ia. mas não ia. mas não ia. mas dessa vez. dessa vez foi diferente. ela sentou. pediu o frango. a coca. e chamou cartola. e duas senhoras. duas senhoras sentaram na mesa ao lado. era como mãe e filha. ou filha e mãe. ou irmãs. ela não sabia. naquela idade. mãe e filha se confundem. e ela ficou reparando. de rabo de olho. pela tangente. uma disse. o que você vai beber. água. e a uma disse. eu vou beber guaraná. e pediram pro garçom. e ele trouxe. depois disso. depois disso ela ficou a observar. isso. a olhar. a reparar. porque ouvir. não. ouvir ela não pode ouvir nada. as duas almoçaram. e as palavras água. guaraná. ecoavam no ouvido dela. água. guaraná. guaraná. água. e mais nada. almoçaram. não sei por quantos minutos. todo domingo é igual. o tempo passa de uma forma estranha. o tempo passa sem que se saiba quanto tempo passou. mas elas ficaram ali. mastigavam. bebiam. e ela. ela a observar. não falaram uma palavra. não trocaram um sorriso. não. não fizeram nada. e ela ficou pensando. sim. esse domingo foi diferente. ela ficou o resto do dia pensando. se aquilo. ah. se não falar nada. se não falar nada era bom. pra ela sempre foi tão estranho. tão estranho almoçar e não falar nada. era por isso. era por isso que levava o cartola. porque sentia que ouvia. sentia que falava. fingia que conversava. mas aquelas duas senhoras. ah. aquelas duas senhoras. juntas. caladas. porque caladas? porque juntas? ah. depois disso. depois disso ela pensou. mas não entendeu. não. não entendeu nada. mas ela sabe. sabe que depois daquele domingo. ah. os domingos. os domingos nunca hão de ser iguais.

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